quinta-feira, 14 de julho de 2011

MÁRIO CHAMIE (1933 – 2011)

[5.7.11 1:45 PM | josé sudaia filho ]
(foto) Bel Pedrosa

Fui aluno de Mário Chamie na Escola Superior de Propaganda de São Paulo.

Suas aulas de semiótica eram memoráveis. Sua fala clara, correta, objetiva, manejando a língua portuguesa com precisão e as idéias com máxima habilidade, a figura do comunicador superando a do intelectual embora o conteúdo do que nos dizia não deixava dúvidas de que era um mestre. Gentleman, impecável, um típico paulistano do tempo da garoa quando se levava o guardachuva, o chapéu e o sobretudo quando se saia de casa, bom humor e perspicácia sempre presentes.

Eu tinha a impressão de que ele, enquanto falava, escrevia um texto magnífico em nossas cabeças, um texto que se fosse gravado e vertido para o papel, não precisaria ser revisado, estaria pronto para publicação. Tanto o conteúdo como a forma.

Na ESPM não faltavam excelentes profissionais lecionando. Pioneira nos cursos superiores de propaganda no Brasil, seguia uma filosofia de usar profissionais do ramo para ministrar os conhecimentos das respectivas áreas. Assim tivemos chance de ter aulas com ‘bambas’ (desculpem a gíria antiga) como J. Roberto Whitaker Penteado, Roberto Duailibi, Alex Periscinoto, Neil Ferreira e Mário Chamie que lecionou lá até recentemente, sendo o mais antigo professor da faculdade.

A cidade de São Paulo, seus moradores e especialmente sua juventude, estudantil ou não, lhe devem muito. Mário Chamie foi secretário municipal de Cultura entre 1973 e 1983, quando criou o Centro Cultural São Paulo, a Pinacoteca Municipal de São Paulo e o Museu da Cidade de São Paulo.

Ganhador de diversos prêmios de literatura, entre eles os Jabuti de 1962 por "Lavra Lavra", o poeta deixou uma grande obra, com diversas publicações.

PRÁXIS

Procurei na internet dados sobre a sua trajetória como poeta:

Depois da poesia concreta, a vanguarda poética dos anos 50 e 60 que mais deu o que falar foi a poesia práxis. Como o nome sugere, a idéia central era construir poemas com base na prática da vida. Segundo Chamie, principal poeta e teórico do grupo, os poemas práxis resultavam de um levantamento de palavras dentro do campo semântico do tema escolhido para o poema ou livro.

Exemplo disso é um dos primeiros poemas de Chamie transcrito abaixo. "Plantio" vem do volume Lavra Lavra (1962), que se propõe a representar o universo do trabalho rural. Assim, lá estão termos como enxada, braço, cova, grão.

Arquirrivais dos concretos, os poetas práxis partiam da idéia de que, no final dos anos 50, a poesia deflagrada pelo Modernismo de 22 atingira um estágio de esgotamento. Em especial, criticavam os poetas da chamada geração de 45, pelo seu beletrismo neoparnasiano, sua repetição de recursos já consagrados e seu retorno às formas fixas, como o soneto.

Chamie tentou de certo modo preservar a estrutura do poema, além de manter um forte rastro de realidade. As suas experiências são interessantes como tentativa de manter a tradição do Modernismo sem renunciar ao espírito de vanguarda.

PLANTIO

Cava,
então descansa.
Enxada; fio de corte corre o braço
de cima
e marca: mês, mês de sonda.
Cova.

Joga,
então não pensa.
Semente; grão de poda larga a palma
de lado
e seca; rês, rês de malha.
Cava.

Calca
e não relembra.
Demência; mão de louco planta o vau
de perto
e talha: três, três de paus.
Cova.

Molha
e não dispensa.
Adubo; pó de esterco mancha o rego
de longo
e forma: nó, nó de resmo.
Joga.

Troca,
então condena.
Contrato; quê de paga perde o ganho
de hora
e troça: mais, mais de ano.
Calca.

Cova:
e não se espanta.
Plantio; fé e safra sofre o homem
de morte
e morre: rês, rés de fome
cava.

Saiba mais sobre a obra de Mário Chamie em:
http://www.algumapoesia.com.br/poesia/poesianet075.htm do poeta Carlos Machado
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/sao_paulo/mario_chamie.html do professor e poeta Antonio Miranda